Hayley Williams concedeu uma entrevista para a edição do reino unido da revista Rolling Stone onde falou sobre seu podcast em parceria com a BBC Sounds chamado “Everything Is Emo”, que abordará o universo do Emo em uma série de 20 episódios. Confira a entrevista traduzida:
RS: Eu amo esse título – sempre penso sobre como tudo é emo: músicas pop tristes, um animal mostrando emoções humanas ou Phoebe Bridgers. Isso é algo que você também considera?
H: Meu Deus, sim. Desde o primeiro dia. Eu fiquei perplexa quando ouvi pela primeira vez a palavra “emo”. Eu procurei na internet e tentei entender, pois estava começando a gostar daquele tipo de música que não era popular no rádio. Eu estava descobrindo esse novo mundo e queria entendê-lo melhor, pois queria conhecer tudo e realmente queria mergulhar de cabeça. O emo mudou muito ao longo dos anos. Mas uma coisa que nunca mudou desde o primeiro dia: as pessoas continuam confusas sobre o que é o emo.
Em um dos artigos que eu encontrei naquela época, tinha 13 anos, Ian MacKaye do Minor Threat e Fugazi disseram algo como “isso é tão estúpido, tudo é emo”. “A música punk é emo, pois as pessoas estão expressando a sua raiva ou a sua frustração”. Eu pude ver isso se desenvolver ao longo dos anos. Como você estava dizendo, uma hora o emo soa como pop punk, na outra o emo soa como Phoebe Bridgers e Conor Oberst fazendo um projeto juntos. Atualmente, as pessoas estão muito mais receptivas às diferentes versões de uma palavra, e eu acho isso muito legal.
RS: É essa qualidade, que não está realmente ligada com o som, mas com um tipo específico de emoção. Você frequentemente sabe se algo é ou não é emo, só não sabe exatamente o motivo.
H: Isso é verdade. É um sentimento que não é dito.
RS: Quando o Paramore estava em ascensão, eu lia revistas sobre rock e sempre haviam algumas bandas, incluindo vocês, dizendo “nós não somos emo, o emo é uma merda”. O que vocês pensavam sobre aquele distanciamento que ocorria?
H: Nós nos preocupávamos muito – especialmente eu – em não ser qualquer um na cena, sendo taxados como poser ou qualquer coisa. Enquanto uma jovem menina, existia uma pressão para não ser ruim. Era algo do tipo: “eu preciso provar a mim mesma 50% mais do que esses caras, não posso mostrar vulnerabilidade, preciso dominar mais o palco e escrever letras melhores”. Em 2004, Kelly Clarkson havia lançado um álbum grandioso [Breakaway], recheado de guitarras. Eu me lembro de pensar: “as pessoas irão nos comparar com a Kelly Clarkson por causa das guitarras e do vocal feminino”. Não era uma competição, apenas estava tentando provar a mim mesma a todo o tempo.
Com certeza, em mais de uma ocasião dizemos que não éramos emo. Também não pensávamos que éramos pop punk. Nas entrevistas, nós não queríamos ser nada em específico. Queríamos ser capazes de transcender aquilo. Quando começamos a tocar na Warped Tour, lá no fundo da minha mente, eu pensava: “quero ser a melhor banda dessa turnê, quero me formar e ser capaz fazer parte do universo que chegaríamos”. Mas, obviamente, a banda surgiu e [o emo] foi o universo em que nos encaixamos. Nós ressentimos muito isso. Agora, podem nos chamar do que quiser, apenas iremos fazer o que fazemos.
O emo fez com que a música punk se tornasse mais acessível e cada vez mais popular, ao ponto que bandas como a nossa estivéssemos na MTV. Agora, estamos no rádio e temos uma versão dessa geração em todo o lugar.
É algo interessante para mim pensar que as pessoas transformam o emo naquilo que querem que seja. Se elas querem que a Phoebe Bridgers seja emo ou underground, então será. Se elas querem que o Paramore seja pop punk ou emo, então, para aquelas pessoas, será. É algo que nunca está a critério das bandas, mas sim dos jornalistas e de como as pessoas pensam. E sinto que, agora, a diferença é que essa geração não parece se importar com a compartimentalização. Não existem inibidores do tipo “eu não quero parecer um poser se ouvir isso”.
RS: Quando eu era uma adolescente no Reino Unido, o Paramore e o MCR não eram as bandas emo mais populares. Mas, pelas lentes da nostalgia, são as que eu me lembro. Em minha memória, havia eu e outras garotas emo curtindo o Paramore.
H: Com certeza. Eu diria que as fases mais populares da música são lideradas por jovens garotas adolescentes. Eu estou feliz que não existe o mesmo tipo de gatekeeping que existia. Acho que demandaria muita energia ser um gatekeeper nessa cena. Isso é algo que estou tentando esclarecer com o programa, de que não existe sentido em bloquear certas pessoas para fora. Eu posso até tocar algumas músicas que não são emo. Existem certas músicas, filmes e personagens da cultura pop que nossa cena havia abraçado. E, enquanto amante de música, quero me lembrar daquela energia. Deveríamos nos animar com coisas legais sem necessariamente precisar gostar de tudo.
Quando eu planejo as playlists, estou penso: não restrinja a nossa cena musical, pois você não quer se tornar um daqueles dinossauros rabugentos que diz ‘isso não é punk!’ ou ‘isso não é emo!’”. Ainda tenho essa voz em mim, o que pode ser uma falha fatal, mas tenho trabalhado para deixá-la de fora.
RS: Falando nisso, eu amei que você reproduziu músicas da trilha sonora de Crepúsculo no primeiro episódio. Você considera aquela franquia como algo cânone para a nova geração do emo? Os adolescentes de hoje simplesmente a adoram.
H: Você precisa olhar para a nossa cena, o nosso mundo e nossa música com um toque de humor. E exageros também. Para mim, Crepúsculo foi o cúmulo do exagero. Não sei se é algo intencional, mas olho para trás e penso: “reparem na maquiagem nesse filme, no complexo brilhante dessas pessoas, tão pálidas que parecem quase transparentes”. Obviamente eles são vampiros, mas também simboliza como muitos de nossa cena musical se pareciam naquela época.
Eu definitivamente sofri quando nós fizemos parte da trilha sonora. Havia uma parte de mim que lia os livros, eu os amava, eram de fácil leitura e muito divertidos. Pensava “puta merda, nós temos uma música em um filme!” e isso era doido. E então o ressentimento veio e pensava: “ah meu Deus, nós somos a banda do Crepúsculo!”. Levou muito tempo para superar aquela parte de mim que dizia “você é uma poser”. Eu apenas tinha pensar: “foda-se, o Radiohead também faz parte da trilha” e isso era louco. Bon Iver também. Não vamos fingir que Crepúsculo não catapultou a nossa banda em uma rota diferente. Nós não éramos tão conhecidos antes da trilha sonora. Ela abriu novas portas para fãs que provavelmente não teriam nos dado a chance ou sequer sabiam que existíamos. Eu olho para trás e isso é muito doido. Kristen Stewart é a princesa Diana e Robert Pattinson é o Batman. E nós ainda somos uma banda, então está tudo certo.
RS: Você disse no podcast que “I Caught Myself” é uma das suas músicas do Paramore favoritas. Isso se deve parcialmente ao fato de também estar na trilha sonora, junto com “Decode”?
H: Aquelas músicas são muito especiais para nós. Quando o Zac retornou à banda, depois de ter ficado longe por seis ou sete anos, nós fizemos um show em Nashville e foi meio que uma surpresa. Nós dizemos a ele: “você escolhe algumas músicas que sentia falta de tocar, pois é o seu primeiro show em um longo tempo”. E então ele disse “Eu quero tocar Decode, eu sempre amei tocar, pois gosto de bater os tambores”. Escrevemos as duas músicas durante uma passagem de som da turnê do “Riot!”. Para mim, elas significam muito para a nossa história como banda – elas vieram durante essa época terrível, quando nós não estávamos nos dando bem e eu penso muito mais sobre isso do que quando participamos da estreia de Crepúsculo, por exemplo. Nós tivemos a sorte que, ainda que as nossas vidas estivessem meio que desmoronando, estávamos fazendo essas coisas maravilhosas que alguns sonham em fazer durante toda a vida. Eu amo o fato de que elas fazem parte de um filme – eles não estão em um álbum do Paramore mas têm uma casa. Isso me recorda de quando eu comprei a trilha sonora de Batman Forever quando era criança e tinha Seal e todos esses artistas, e era muito dramático e escuro. Tipo, nós estamos em uma das trilhas sonoras. Isso é ridículo. Isso é estúpido. E eu amo isso. Então precisava incluir.
RS: Quando você parou para planejar o podcast, de que forma você passou pelo subgênero e decidiu o que entrava e o que ficava de fora?
H: Fazer playlists é algo agonizante para mim, mesmo quando eu estou fazendo uma para a minha irmã. Eu fiz uma mixtape antes na minha vida e não sabia como as pessoas conseguiam fazer aquilo. Eu coloco muita pressão sobre mim mesma, para fazer com que as playlists sejam como um arco emocional. Mas a coisa mais engraçada para mim acabou sendo redescobrir músicas, pois nem todas são as minhas favoritas do mundo inteiro. Estou tentando fazer justiça à época que essas músicas foram lançadas, à cena musical que elas surgiram. Logo, também estou tentando gostar de novas coisas, para que as pessoas possam descobrir bandas novas como Wet Leg e Fontaines D.C., que provavelmente são maiores no outro lado do oceano, mas que as pessoas precisam conhecer. Onde estariam se todas essas bandas, a cena punk e os diferentes subgêneros não existissem, sabe?
RS: Em uma publicação recente que fizemos com o Bring Me the Horizon, Oli Sykes disse que aquela emoção extrema desapareceu da música por 10 anos e, agora, as crianças estão a redescobrindo. O que você pensa sobre isso? Por que as crianças estão sendo atraídas pelo emo, depois de uma década sendo tratada como algo que não era popular ou legal?
H: Oh, essa é uma grande questão. O que é considerado popular varia como se fosse um pêndulo, balançando constantemente de um lado para outro. E eu enxergo isso em tudo. Política, música, moda: nós estamos sempre indo de um extremo para um novo extremo, sem sequer reconhecer toda uma zona cinza no meio. Eu realmente acho que estamos em uma área cinza e não acho que isso seja ruim.
Acredito que várias coisas boas surgiram nos últimos 10 anos, várias coisas emocionantes também. Eu penso sobre músicas que escrevemos nos últimos 10 anos que eu não teria escrito há 15 ou 20 anos, músicas que exploraram nuances de sentimentos e que não são tão extremos. Isso fez com que eu conhecesse melhor os meus sentimentos. Eu tinha esse problema, de pensar que tudo deveria com raiva, que deveria estar irritada a todo tempo. E ainda estou. Eu sou uma mulher adulta e ainda tenho muita raiva em mim. Mas existiam coisas que eu precisava explorar sem aquela raiva, sem o coração partido, sem a perda ou luto. E tudo que está no meio daquela bagunça.
Mas olha para o mundo – o mundo está tão fodido e eu sequer consigo imaginar como é ser um adolescente hoje. Eu não consigo imaginar como deve ser crescer em um mundo no qual, desde o dia em que você nasce, existem câmeras apontadas para a sua cara. Você está em redes sociais e não sabe o que existe lá fora sendo que você está lá com a sua imagem e com o acesso a toda essa informação, que pode ser prejudicial. Olhando por outro lado, os jovens estão mais cientes de coisas que, quando eu tinha 15 anos, sequer sabíamos que existiam. Não havia um diálogo profundo sobre identidade, políticas, crise climática. Existe toda uma pressão por trás desses temas, e é bonito ver que as crianças se preocupam. Eu acho que elas precisam de um lugar para colocar toda a sua frustração, todos aqueles sentimentos extremos que, provavelmente, os seus cérebros ainda não conseguem compreender. Você não pode esperar de um adolescente, ou um jovem, racionalizar tudo aquilo. Eles não deveriam, mas é o mundo em que vivemos.
Mais detalhes sobre o projeto podem ser encontrados aqui!
Matéria Original. Tradução e adaptação Paramore BR.