Nylon Magazine: “Hayley Williams em carreira solo, mas nunca sozinha”
Por Raquel Guets em 10 de maio de 2020
Hayley Williams concedeu entrevista intimista e reveladora, publicada no dia 21/04 e escrita por Lauren McCarthy, revelando alguns detalhes sobre o processo de composição de seu álbum de estreia solo (mas sempre bem acompanhada) “Petals For Armor”, as parcerias que surgiram para o projeto (inclusive uma inusitada parceria com Kristen Stewart para a direção de um videoclipe). Leia a entrevista completa e traduzida.
Hayley Williams está no meio de uma frase quando o seu telefone começa a tocar uma música familiar – dela mesma. “Isso é constrangedor”, ela diz, rindo enquanto ela se estica para alcançar e pausar o seu próprio single que tocou aleatoriamente. “É uma playlist que meu amigo fez e eu tenho escutando”. É a segunda semana de quarentena, e Williams, 31, tem se focado na música – Moses Sumney, Louis Prince, Caribou, e o novo de Dixie Chicks – para continuar sã enquanto se auto-isola na sua casa em Nashville. Ela cozinha as receitas de Alison Roman, incluindo o infame “ensopado”, que ela tocou no café da manhã antes da nossa chamada. Ela está assistindo os filmes de terror de Ari Aster. Ela está mandando memes. Ela está fazendo tudo o que as outras pessoas estão fazendo nesses tempos estranhos. E ela também está lançando seu primeiro álbum solo, Petals for Armor.
Williams nunca quis se destacar, um jeito de ser que ela traz desde quando ela tinha 8 anos de idade em Meridian, Mississippi, tentando formar uma formar uma banda local enquanto a maioria das garotas que conseguiam cantar queriam ser como a Britney Spears. Apenas alguns anos e uma mudança para o Tennessee depois, surgiu o Paramore, uma ideia adolescente de Williams e seus colegas de sala Zac e Josh Farro. Ao longo de próxima década e meia,eles se tornaram uma das maiores bandas de rock do mundo – como headliners da Warped Tour em 2005, levando para casa em 2015 o Grammy pela melhor canção de rock, e vendo três álbuns se tornarem discos de platina. No meio de tudo isso, Williams tem sido a constante da banda; enquanto outros membros do Paramore foram e voltaram, Williams nunca saiu.
Mesmo nos primeiros dias, era impossível tirar os olhos de Williams quando ela estava no palco. “Ela é excelente em mrdas que são tão difíceis para cralho para mim, ela faz com que isso pareça fácil para cralho”, diz a amiga de Williams Phoebe Bridgers. “Não é fácil ser capaz de segurar uma nota perfeitamente e ficar na frente do palco. Há uma área de conforto ali. Eu ainda digo que o melhor show que eu já vi foi o Paramore no The Greek em Los Angeles. Ela escolheu alguém e levou para cima do palco para cantar uma música inteira. Como que você pode saber se aquela pessoa não vai fder tudo ou tentar transar com você ou ser estranha?”.
Se Williams sentiu os efeitos que ela tinha nos fãs e na colegas, ela nunca deixou transparecer. Ela participou de hits extremamente populares em rádios (B.o.B, “Airplanes”, e “Stay the night” do Zedd), sendo creditada como “Hayley Williams from Paramore”, (seu nome no twitter também ainda é “hayley williams from paramore”). “Essa é a razão pela qual eu sempre me senti a salvo em uma banda. Mesmo quando eu tinha 8 ou 9 anos, eu estava tentando recrutar amigos para estar em uma banda comigo. Eu era a baterista naquele momento. Eu não queria estar a frente”, ela diz. Com o Petals for Armor, não é apenas ela a frente: é apenas ela. Ponto.
Hoje, os traços da assinatura de persona da era RIOT! de Williams – o cabelo assimétrico vermelho, as roupas neon – já se foram. Pelo skype, ela está de volta a um cabelo loiro mais natural, sua pele está limpa, e ela está vestida. “Eu fiz isso para você, porque eu literalmente tenho parecido como uma mrda, nem ao menos tentando”, ela gesticula por trás do seu top colorido de Collina Strada. “Eu participei do desfile dela durante a Semana de Moda de Nova York, e Hillary [Taymour, a designer da marca e diretora criativa], me atualizou sobre Nova York. De repente, eu recebi um lindo pacote dela, então eu fiquei ‘Sim! Agora eu tenho algo para usar na minha entrevista’”. Isso foi naquele desfile num domingo a noite em fevereiro – o primeiro desfile que ela sequer esteve – aquela Williams, com pouca fanfarra ou aviso prévio, surpreendeu uma pequena sala de editores de moda com a primeira performance de “Simmer”, a primeira música a ser lançada de seu álbum. (O álbum está sendo lançado em três EPs de cinco músicas. Part I foi lançado inteiro do dia 8 de fevereiro, com o Part II sendo lançado agora e Part III para ser lançada em 8 de maio). Os stories do Instagram de editores de moda mostraram Williams trabalhando a passarela como um palco em uma arena, enquanto as modelos criavam um moshpit improvisado atrás dela. Williams supostamente deveria estar em uma pausa agora. No final de 2018, Paramore estava empacotando a turnê mundial para o After Laughter, e decidido tirar o seu primeiro hiato em quase uma década. Ela revelou que durante a turnê ela e o guitarrista do New Found Glory Chad Gilbert se divorciaram depois de 10 anos juntos e menos de um ano depois de seu casamento. Pela primeira vez em quase uma década, Williams não tinha nada além de tempo livre.”Eu atingi um novo nível onde eu meio que estava: ‘Mrda, eu acho que tenho que descobrir tudo’. E eu me encontrei no meio de uma terapia intensiva que eu jamais estive”. A terapia dela envolveu escrever sobre seus sentimentos, o que aconteceu tão facilmente que ela nem conseguiu notar que ela estava escrevendo letras novamente.
“Quando eu terminei ‘Simmer’, eu estava: ‘O que eu estou fazendo? O que é isso?’”. Ela ligou para Joey Howard, baixista de turnê do Paramore (e agora co-autor das músicas para esse álbum) e seu colega de banda Taylor York, que entrou para o Paramore em 2007, para ajudar em seja lá o que ela estivesse fazendo. “Eu realmente estava precisando criar algo com pessoas com quem eu me sentia confortável em novos caminhos que nem sempre eram confortáveis”, ela disse. “A parte mais legal é que eu não sentia isso desde que eu tinha 15 ou 16 anos. Não estou dizendo que eu não me diverti escrever os álbuns do Paramore, [mas quando] nós éramos crianças, nós só faziamos isso porque não tinhamos mais nada para fazer. É ótimo ter isso quando adulta, porque eu acho que nós raramente nos lembramos como é apenas tocar”.
Quando ela terminou “Cinnamon”, uma música com batida funk sobre os confortos da sua casa, Williams reconheceu que ela estava fazendo músicas e que ela queria mostrar isso ao mundo. Mas ela ainda relutou em considerar um um projeto solo. “Eu pensei, ‘Talvez eu possa só criar um pseudônimo e colocar isso no Spotify, apenas para sentir que lancei isso’”, ela diz. “Eu não estava pronta [para ter meu nome nisso]. Muitos dos meus amigos me chamam de H, e eu pensei, ‘Talvez eu lance apenas como H’”. Foi York que a convenceu de que poderia ser parte do Paramore e ainda usar seu nome em um trabalho que veio dela e apenas dela.
Williams não sabe porque lutar contra ela mesma era tão difícil para ela, mas ela está começando a pensar que ela não precise. “Eu tenho sorte que eu tenho essa história com o Paramore, e eu tenho uma círculo de amigos e artistas, mas eu também sou capaz de pegar minha força pessoal e ir com ela com amplificação máxima sem explicar. Eu acho que a vida te empurra para onde você precisa estar. Em algum ponto você não pode mais negar”.
No Petals For Armor, Williams mostra um novo nível de vulnerabilidade e crueza que ela diz ter vindo de começar algo desde o rascunho. A primeira música que Williams escreveu para o projeto foi “Leave It Alone”, uma faixa assombrada, quase como jazz, que começa com os versos “Don’t nobody tell me that God don’t have a sense of humor/’Cause now that I want live, well, everybody around me is dyin’”. É emblemática nas faixas do Part I, a mais obscura dos três EPs. “Eu posso tentar me segurar enquanto eu escrevo, mas eu começo a ter uma relação ruim comigo mesma quando eu começo a criar maneiras de esconder os meus sentimentos”, diz Williams. “Escrever é bom porque quando você coloca as coisas no papel, você não tem outra escolha além de vê-las”.
O que Williams não quer para as suas letras é serem confundidas com uma recapitulação literal de sua vida. “Algumas dessas músicas saíram tão poéticas porque é uma forma de autoproteção”, ela diz. “Eu precisava tirar essas coisas de mim”. Antecipar o lançamento das músicas mais pessoais provocou uma certa ansiedade, mas “toda história tem mil lados”.
“Tudo o que eu posso fazer é contar as minhas experiências”, ela diz, “e também não me sentir culpada por ter essas experiências… O que as pessoas podem fazer? Eu não sei, não é realmente da minha conta”.
Mesmo através de uma tela, você pode ver a casa de Williams em Nashville cheia de luz. É pequena, Williams diz – ela se refere a ela como um chalé. “Isso é o que faz eu me sentir a salvo, eu acho”. Ela mora na área desde sua adolescência, salvo por um breve período em Los Angeles. “Eu estava realmente sozinha em LA”, ela diz. “Eu estava realmente no meu mundo de fantasias, pensando que meu relacionamento iria funcionar. Eu ia na mercearia, voltava para casa e cozinhava antes dele chegar em casa. Eu não sabia o que eu estava fazendo, mas era apenas solidão”.
Em Nashville, ela nunca esteve sozinha. Ela conheceu os Farro nas redondezas de Franklin, Tennessee, quando ela tinha 11 anos. “Eu era muito infeliz. Minha família tinha se quebrado”, ela relembra. “Quando eu me mudei, eu conheci Zac, esse foi o começo da minha vida. Eu posso ser super dramática sobre isso, mas eu vou manter isso leve dizendo apenas que aquele momento mudou minha vida, e agora eu tenho que fazer isso”.
Tando Farro quando York ainda moram perto. “As pessoas com quem eu cresci fazendo as coisas são as mesmas pessoas que eu busco”, ela diz. “Nós temos uma linguagem que não é falada. Nós não pensamos ‘Ei, vamos ligar para esse cara que tem esse grande nome’, nós pensamos ‘Vamos ligar para esse amigo que conhece outro amigo’. O fato de que eu cresci com o mesmo grupo de pessoas desde os meus 13 anos até os meus 31, e nós ainda fazemos coisas juntos? É um presente. O que acontece com isso?”.
Williams é rápida em distribuir o reconhecimento com todo mundo com quem ela trabalha, postando os nomes de todos aqueles que a ajudaram a fazer cada uma das músicas do Petals, desde produtores até assistentes de mixagem – créditos que normalmente ficam com letras miúdas em notas de rodapé. “Ela realmente entende sobre créditos. Ela é uma colaboradora incrível”, diz a fotografa Lindsey Byrnes, amifa próxima de Williams e diretora criativa para o projeto. Juntas, o par criou uma matriz de visuais para cada etapa do desenvolvimento do álbum, desde os videos teasers arrepiantes de janeiro, até o colorido, altamente dançante vídeo musical para “Cinnamon”, assim como a capa do álbum e as fotos para esta matéria.
“Eu nunca tive pessoas para tirar fotos minhas da maneira que ela faz”, Williams fala sobre Byrnes. “E também ela é um ser humano incrível. Falo com ela sobre qualquer coisas, seja sobre o que está acontecendo nesse momento no mundo, ou minha ansiedade, ou as coisas dela – eu realmente preciso desse companheirismo e amizade verdadeira com meus colaboradores criativos. Senão, qual o ponto?”.
Por Skype, Williams pega um caderno onde eles colocaram tudo junto. Está mais para uma encadernação toda estufada. “Eu usei lápis número 2 nessa droga”, ela diz rindo. O conteúdo do caderno inclui notas sobre o que cada canção trata e as cores e padrões que Williams associa a elas. “A primeira palavra que eu falei para Lindsey foi textura. No último álbum do Paramore, tudo era feito em color-block. Com isso, eu realmente queria muitas texturas e cores e luzes surpreendentes”.
Williams sempre entendeu como imagem e música interagem. “Eu amo a psicologia do marketing”, ela diz. Ela também comanda e é co-proprietária de uma companhia de tintas de cabelo, Good Dye Young com o hairstylist Brian O’Conner. “Mesmo voltando a época quando estávamos fazendo o RIOT!, muitas coisas eram tipo ‘Ei, vamos fazer isso ou trazer as pessoas nisso’. Eles entraram em um estilo de vida, pintando seus cabelos de cores estranhas e usando calças jeans skinny vermelhas e amarelas. Tudo fazia parte de uma atmosfera. Eu sempre gostei disso”.
Se existe alguma dúvida sobre a habilidade de Williams de construir uma marca, é só checar o “Corporate Nightmare Song”, um esquete digital de novembro, em um dos episódios do Saturday Night Live estrelado por Kristen Stewart. No esquete, sobre punks trabalhando em escritórios, Stewart canaliza Williams na era RIOT!, coroado com o cabelo vermelho assimétrico e os jeans skinny. “Cara, eu nunca vivi tão intensamente aquele momento”, Williams diz. “Ela ligou para Lindsey – que é a minha conexão com ela, e não “Crepúsculo”, ao contrário do que a maioria acredita [Paramore contribuiu para a trilha sonora do filme com a canção “Decode”] – e foi como, ‘Você e Hayley precisam ver o SNL hoje’. Quando eu vi no dia seguinte, eu morri. O esquete inteiro era perfeito. O esquete literalmente fez eu me sentir um pouco atacada”.
A própria Stewart quase teve suas mãos em um pedaço do Petals For Armor. “Ela ia dirigir o clipe para ‘Roses/Lotus/Violet/Iris’”, conta Williams. “Ela escreveu o roteiro mais bonito que eu já vi. Eu estava chocada. Ela é uma escritora maravilhosa”. O vídeo entretanto não aconteceu devido a desencontro de agendas que não se alinharam. “Talvez ainda possa acontecer”, Williams diz. “Talvez no final de tudo isso seja o que vamos fazer”.
Essa música, lançada no dia 19 de março, tem créditos adicionais a banda Boygenius, que é composta por Bridgers, Julien Baker, e Lucy Dacus. A colaboração surgiu acidentalmente quando Williams falava com Baker, uma amiga próxima, que ela planejava pedir para colaborar na faixa em uma concerto local. Dacus estava lá também e mencionou que Bridgers poderia vir para a cidade no dia seguinte. Bridgers descreveu a gravação como “o melhor encontro de família”, com comida vegana e prévias de novas músicas. A gravação do dia é a única participação do álbum. “As vezes eu fico intrigada com a quantidade de participações que as pessoas fazem hoje em dia. Toda música tem uma participação. Essa foi poderosa e elas realmente acrescentaram aos meus vocais com a singularidade delas e é sobre isso que toda a droga da música fala: sermos capazes de fazer algo umas pelas outras. Isso aprofundou o significado para mim”.
Para alguns artistas, a pandemia global coincidir com o lançamento do primeiro material solo poderia ser um desastre. Para Williams, é uma chance para usar uma legging com estampa de leopardo e portar um vídeos de três minutos fazendo uma rotina de exercícios ao som de sua nova música “Over Yet”. “Nós estamos mudando e ajeitando as coisas conforme nós vamos fazendo”, Williams fala sobre o plano do lançamento do álbum. “Agora é como, ‘Obrigada a Deus por termos lançado tudo de uma vez porque eu preciso de algo para fazer todo dia’. Eu estou tentando descobrir um jeito de me manter criativa e inventiva, me conectando com as pessoas através da música”.
Williams tem estado ocupada portando vídeos dela mesma cozinhando em cada, tocando uma das músicas favoritas dela, e dando destaque para fãs fazendo covers de suas próprias músicas. “Eu realmente não gosto de ficar presa no meu celular, mas ontem eu meio que fiz isso”, ela conta. “Eu fiquei no celular o dia todo, repostando porcarias, vendo covers das pessoas, o que é muito legal. O fato das pessoas estarem aprendendo as coisa tão rápido, explode a minha cabeça. E eles são realmente muito bons”.
Williams ainda planeja sair em turnê pelo Petals For Armor (por ora, nenhuma data foi cancelada ou reagendada), tocando em lugares menores que o Paramore tocou recentemente. “Eu estou perfeitamente dividida entre estar muito animada para ver os fãs de Paramore novamente, e estar aterrorizada”, diz ela. “Estarei no palco e quando eu me virar, Taylor e Zac não estarão lá”. Apesar do reagendamento incerto, ela ainda está trabalhando no visual da turnê e na setlist, que ela diz que constará covers de músicas que ela ama. “Eu acho que a única maneira de esse lançamento funcionar para os fãs é ser super transparente e pensar ‘Estou descobrindo isso agora'”, diz ela. “É por isso que me sinto tão grata. E talvez algumas coisas muito bonitas virão a partir disso”.
“Só porque eu tenho um álbum não significa que estou flutuando sobre essa m*”, ela adiciona. “Eu estou precisando de algum tipo de conexão, também, e é isso o que a música faz. Esse é o trabalho que eu tenho que fazer”.
Tradução e adaptação: Paramore BR